As Mudanças Climáticas São Reais - Um Chamado à Ação em Roraima
Ainda que em meio às cinzas, a vida se renova na Comunidade Indígena Tarau Paru, em Pacaraima. Foto: @adri.duarte.photography
Em Roraima, o pulso da Terra se faz sentir com urgência. As chamas que consomem as serras e a fumaça que turva o céu de Boa Vista são manifestações visíveis de uma crise que transcende fronteiras: as mudanças climáticas. Este não é um mero alerta ambiental, mas um grito de socorro de nosso planeta. A situação é um reflexo de um desequilíbrio mais profundo, uma chamada para reconhecermos a interconexão entre nossas ações e o meio ambiente.
A história de Eunice Foote, a feminista pioneira da ciência climática, destaca o papel fundamental das mulheres na ciência e na compreensão das mudanças climáticas. Como uma forte defensora dos direitos das mulheres e uma cientista amadora, Foote foi uma das primeiras a explorar experimentalmente os efeitos dos gases de efeito estufa na atmosfera, Foote foi uma das primeiras a explorar experimentalmente os efeitos dos gases de efeito estufa na atmosfera. Em um estudo realizado em 1856, ela demonstrou que aumentar a concentração de dióxido de carbono na atmosfera resultava em um aumento da temperatura.
No entanto, apesar de sua descoberta pioneira, a contribuição de Foote para o entendimento das mudanças climáticas foi largamente ignorada por décadas. Somente recentemente, cerca de 10 anos atrás, sua pesquisa foi redescoberta e reconhecida como uma das primeiras evidências científicas da ligação entre as emissões de CO2 e o aquecimento global.
Essa história ressalta a importância de reconhecer e valorizar as contribuições das mulheres na ciência, bem como a urgência de agir diante das mudanças climáticas. No contexto de Roraima, onde as consequências das mudanças climáticas são evidentes, o legado de Foote nos lembra da necessidade de ação imediata para mitigar os impactos e proteger nosso planeta para as futuras gerações. Suas descobertas ecoam na urgência do chamado à ação em Roraima, destacando a importância de medidas como a educação ambiental, o reflorestamento e a adoção de práticas sustentáveis para superar os desafios climáticos que enfrentamos atualmente.
As estatísticas são alarmantes e as histórias pessoais são comoventes. Em 2024, Roraima registrou um recorde de focos de calor, conforme reportagem da Agência Brasil (EBC). Esses eventos catastróficos ocorrem em meio à permissão para queimadas, contribuindo para uma série de consequências devastadoras. Famílias inteiras foram deslocadas de suas casas, meios de subsistência foram destruídos e a rica cultura local enfrenta uma ameaça sem precedentes devido à destruição ambiental. A seca severa, agravada pelo fenômeno El Niño, levou o Rio Branco a atingir níveis baixos históricos, afetando gravemente o abastecimento de água e a vida aquática da região. Como residente de Roraima, testemunho diariamente os impactos desse cenário. A fumaça densa proveniente das queimadas turva o céu de Boa Vista, contribuindo para que a cidade figure como o 15º local mais poluído e perigoso do planeta, de acordo com uma matéria publicada na FolhaBV. Esse dado alarmante evidencia a urgência de enfrentar as consequências das mudanças climáticas e proteger nossa saúde e nosso meio ambiente.
Além disso, o recorde de calor em Roraima tem gerado incêndios em Terras Indígenas, conforme reportado pelo ISA (Instituto Socioambiental). As queimadas e a escassez de água potável têm impactado diretamente as comunidades indígenas, exacerbando os desafios enfrentados por esses povos. Essa situação evidencia a urgência de abordar as mudanças climáticas e proteger não apenas o meio ambiente, mas também os direitos e o bem-estar das comunidades tradicionais.
Triste reflexo das queimadas na Comunidade Indígena Tarau Paru. Foto: @adri.duarte.photography
É crucial destacar que as comunidades indígenas desempenham um papel fundamental na preservação das florestas e na mitigação dos incêndios florestais. Ao contrário da noção equivocada de que são os principais responsáveis por esses incidentes, muitas comunidades indígenas têm sido os guardiões tradicionais das florestas, mantendo um profundo respeito e conexão com o meio ambiente que as cerca. Seus conhecimentos ancestrais sobre práticas de manejo sustentável da terra frequentemente contribuem para a conservação da biodiversidade e para a prevenção de incêndios.
Estudos, como o realizado por Angela May Steward e colaboradores, intitulado "Saberes que vêm de longe: usos tradicionais do fogo no Cerrado e Amazônia", destacam a importância desses conhecimentos tradicionais na gestão do fogo e na proteção das áreas florestais. Tais estudos demonstram que áreas protegidas e gerenciadas por povos indígenas têm menor probabilidade de experimentar grandes incêndios florestais, ressaltando a eficácia dessas práticas ancestrais na conservação ambiental.
Portanto, é essencial reconhecer e apoiar o papel das comunidades indígenas na proteção das florestas e na luta contra os incêndios, garantindo o respeito por seus direitos territoriais e seu conhecimento tradicional.
Agora, devemos transformar essa consciência em ação. A Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, um dos mais importantes tratados internacionais sobre o meio ambiente, estabelece metas para estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera. Seu objetivo é prevenir uma interferência humana perigosa no sistema climático, reconhecendo a urgência de abordar as mudanças climáticas. Este acordo global não apenas reconhece os desafios enfrentados, mas também estabelece diretrizes para a cooperação internacional na redução das emissões de gases de efeito estufa e na adaptação aos impactos já observados. A implementação efetiva dessas medidas é essencial para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e proteger não apenas Roraima, mas todo o planeta, das suas consequências cada vez mais graves.
Como alguém que vive e respira Roraima, sinto na pele as consequências das mudanças climáticas todos os dias. A fumaça densa nos obriga a ficar dentro de casa, a sair apenas de máscara e a abandonar as atividades ao ar livre que tanto amamos. O primeiro passo é o diálogo - falar sobre essas questões, compartilhar nossas experiências e preocupações. E mais do que falar, precisamos agir. Cobrar das autoridades ações concretas e efetivas é essencial. Não podemos mais nos dar ao luxo de sermos passivos.
Como confluente e integrante do Movimento Plantaformas, estou comprometida em usar minha voz para promover essa conscientização e mudança. Convido vocês, pessoas leitoras e cidadãs, a se juntarem a mim nesta jornada. Juntes, podemos fazer a diferença e garantir que as belezas naturais e a cultura de Roraima sejam preservadas para as futuras gerações. É um caminho que devemos percorrer com determinação e esperança, pois cada ação conta na construção de um mundo mais equilibrado e sustentável.
Março de 2024, Roraima, Amazônia Brasileira.
*Autoria: Gyulle Anne Cunha é confluente do Movimento Plantaformas em Roraima. Militante e educadora menstrual, criadora da Mãe da Lua Menstrual (no Instagram @maedaluamenstrual), embaixadora na EcoCiclo Absorventes (@ecoclicoabsorvente).
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